Mensagem do presidente

27/02/2020 15h25
Os aplicativos de entregas e seus efeitos colaterais

O que até anos atrás parecia ser a “solução” para o desemprego, para o cliente de delivery e para o comerciante do ramo de alimentação, hoje já nos traz um novo – e verdadeiro cenário: os efeitos negativos dos aplicativos de entregas rápidas.

Primeiro veio a ilusão do motoboy por se tornar “dono” do seu próprio negócio. Com o sonho de ganhar 3, 4 vezes mais do que ganhava com o trabalho formal, o entregador abriu mão de seus direitos trabalhistas e passou a labutar em altas jornadas por conta própria, assistindo a cada dia uma derrota desenfreada travada consigo mesmo, passando a enxergar a realidade de ter que trabalhar sete dias na semana por 10, 12, 15 horas sobre duas rodas, enfrentando chuva, frio, sol e o medo de sofrer um acidente, de ser bloqueado no app e não ter nenhuma assistência ora garantida em seus tempos formais.

Depois veio o tomador do serviço, também iludido com o “preço baixo” e “agilidade” nas entregas. Não demorou muito para o cliente perceber que, além de endossar um retrocesso social, perdeu-se a qualidade, a personalização, a experiência positiva e, principalmente, a confiança na prestação de serviço com “encomendas que nunca chegam ao destino” em alguns casos, como relata recente reportagem da BBC Brasil, intitulada “Como apps de entrega estão levando pequenos restaurantes à falência”.

A exemplo dessa matéria, agora, a decepção parte dos até então parceiros comerciantes, donos de pequenos negócios do ramo de alimentação.

O jornal relatou a insatisfação de vários empreendedores que depositaram nos aplicativos de delivery o sonho de crescer e prosperar com essa tal “parceria”.

A reportagem conversou com donos de restaurantes, cafés, bares e lanchonetes “que colecionam mais dissabores que vantagens” nessas empreitadas. Entre os entrevistados, há o relato de um comerciante que após investir em seu estabelecimento desistiu de empreender ao se decepcionar com as ofertas oferecidas por um dos apps. Segundo ele, no início tudo foi perfeito, mas aos poucos teve que aceitar as negociações inviáveis da plataforma.

Segundo a matéria, pequenos empreendedores se queixam das propagandas agressivas dos aplicativos do tipo “compre um lanche e ganhe outro” e que acabam fortalecendo a prática de dumping, que é quando um fornecedor põe à venda um produto a um preço muito inferior, enfraquecendo os demais – geralmente os pequenos. “A minha porção de calabresa custa R$ 14. Eu tenho que pagar 27% sobre o preço do pedido. Como é que eu vou dar um desconto de R$ 10? Vai me sobrar o quê?”, questiona uma das entrevistadas.

Para a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), “o aplicativo não pode praticar subsídio na venda dos produtos, o que acaba deturpando o equilíbrio do mercado”.

E í voltamos para o nosso cenário enquanto empresários do setor de entregas rápidas. Esse mesmo desequilíbrio, hoje visto pelos queixosos donos de comércios, já vem sendo debatido há quase cinco anos em nosso segmento. O que se pode ver, então, é que não são somente os motoboys, os empresários e os tomadores estão insatisfeitos com essa discrepância toda. Até mesmo os “parceiros” desses apps passaram a entender que nesse jogo não existe ganha-ganha. Poucos ganham, enquanto muitos – a grande maioria dos pequenos empresários e que movimenta boa parte da economia do país - disputam uma ínfima e insustentável fatia desse bolo. O que precisa ser feito? Mudança urgente para, de fato, haver igualdade de direitos e deveres aos envolvidos.

(Palavra do presidente do SEDERSP, Fernando Souza)