Mensagem do presidente

31/10/2019 23h00
TRTs reconhecem vínculos trabalhistas entre aplicativos, motoristas e motoboys

Aplicativos de celular como fonte de renda: essa é a nova realidade de milhares de pessoas por todo o mundo. O canal TRT2, do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, fez uma reportagem sobre o tema: Aplicativos e relações de trabalho.

A matéria relatou a vida de um motorista de aplicativo que trabalha cerca de 12 horas por dia, seis vezes por semana e ganha cerca de cinco mil reais por mês. Parece muito, mas se colocar no papel todos os benefícios deixados de lado e todos os custos mensais com o veículo, o valor cai, e muito.

O rapaz, que também é músico e professor de música, sabe que para ter férias e conseguir ajustar suas economias é preciso muito trabalho, já que não tem carteira assinada nessa atuação com app e reconhece que somente ganha mais quando trabalha muito mais. Sua expectativa é encontrar um emprego com registro em carteira e garantir maior tranquilidade.

No que se refere ao seu trabalho, considerado como “independente e autônomo” por parte das empresas de aplicativos, o motorista entende o caso de forma diferente. Ele relata que pode haver punição, ficar sem poder fazer corridas por algumas horas e até mesmo por um dia, sem contar que corre o risco de ser cortado da plataforma, caso tenha pontuação ruim por parte dos tomadores de serviço.

Essa é a mesma realidade que vivem os motoboys que se submetem ao trabalho de entregas rápidas por aplicativos. Muitos relatam que para ganhar um pouco mais precisam trabalhar por 12/ 13 horas por dia. Alguns vêm de longe, de cidades vizinhas e passam o dia inteiro ao relento e, caso recebam uma nota ruim podem ser bloqueados também. Discutimos esse tema nesta semana em um debate na rádio Baruk FM. A falta de relação humana no serviço de entregas por aplicativo foi um dos temas centrais da conversa.

Também destacamos essa questão trabalhista e a concorrência desleal por parte dos apps em entrevista concedida à revista de logística Valor Setorial, do jornal Valor Econômico, publicada na edição deste mês.

Essa realidade virou pauta não só nas grandes mídias como também nos tribunais trabalhistas.

Na reportagem citada no início deste texto, o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região reconheceu a existência de vínculo entre a empresa de aplicativo, “porque ficou provado que a empresa do transporte controlava o trabalho do motorista. Decisões semelhantes já foram registradas também em outros lugares do mundo como no Reino Unido e nos Estados Unidos”, informa o repórter.

A matéria falou com especialistas na área trabalhista, que também esclareceram a existência dessa relação empregado X empregador.

Um dos entrevistados é a juíza do Trabalho Maria Cristina Trentini. Ela entende que o reconhecimento de vínculo está ligado ao desvio de finalidade do contrato firmado entre a empresa de aplicativo e o prestador de serviço.

“Nós temos uma plataforma onde a parte faz a sua adesão a esse sistema de trabalho em que ela já prevê que a pessoa seja filiada ao ISS, que ela possa se vincular e desvincular do aplicativo no momento que bem entender, onde ela vai gerir a sua própria rotina de trabalho horário e disponibilidade. Nos casos em que isso não for respeitado, evidentemente que a gente vai ter um caso de desvio de finalidade e aí, nesse caso em específico, comprovada essa situação, pode sim existir um reconhecimento de vínculo de emprego”, explica a magistrada.

Também entrevistado pela TRTV, o professor Guilherme Feliciano, do departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da USP, acredita que é preciso estabelecer direitos mínimos para os trabalhadores nessas condições, inclusive a definição de uma remuneração mínima.

Esse é o entendimento não só desses dois especialistas e sim de profissionais do direito do trabalho de várias regiões do país e do mundo inteiro. Também no Estado de SP, em Campinas, na 2ª Vara do Trabalho do TRT da 5ª Região, um juiz condenou uma empresa de aplicativo de motorista por reconhecer vínculo de trabalho. Além da cobrança de R$ 10 mil reais por danos morais ao trabalhador, o magistrado determinou que a empresa de app pagasse aviso prévio indenizado de 30 dias, 13º salário proporcional ao tempo trabalhado, férias e FGTS. Na ação, o motorista argumentou ter sido admitido em 2017 sem registro em Carteira e desligado quatro meses depois sem justa causa. (veja em notícias SEDERSP de 24/10/2019).

Vale lembrar que recentemente na Califórnia, onde fica o Vale do Silício, berço da tecnologia, o governador sancionou a lei que reclassifica trabalhadores de aplicativos terceirizados como funcionários das empresas de apps.

Está mais do que evidente que há, sim, vínculo empregatício entre o motorista, o motoboy e as empresas de aplicativos. Continuamos nessa defesa, por entendermos que estamos no caminho certo.